Oportuna essa colaboração do Tuca, nos relembrando um texto de Millôr.
por Millôr Fernandes
“Os cães ladram e a caravana passa”. A frase é sempre usada com sentido pejorativo em relação aos cães, como se ladrar fosse uma atividade inferior e/ou inamistosa em si mesma. Significa que os cães são invejosos, porque ladram para a caravana.
Na verdade, na frase, os cães nem são cães: estão ali no lugar dos raivosos e dos invejosos. Os cães representam coisas e sentimentos baixos, pessoas de índole mesquinha. Por isso, a caravana passa. Isto é, passa soberba. Passa não dando a menor pelota. Passa sem ligar para os latidos de inveja e ódio. Pois toda caravana é bacana, superior, acima dos vãos latidos da plebe.
Vejo a caravana do provérbio passar: é uma caravana rica, constituida de camelos fortes, racudos, bem-nutridos, magnificamente ajaezados. É uma caravana de corajosos comerciantes, daqueles que ampliaram fronteiras e enriqueceram o mundo. Representam a intrepidez, a Glória, a riqueza dos tempos. Por isso passam diante dos cães – famintos, claro! – que ladram esterilmente.
Se a caravana quisesse, pararia, bateria nos cães, ou os mataria, e só depois iria embora. Mas, pra que? Ela faz ouvidos moucos, ouvidos, propriamente, de mercador e se vai sem perder tempo com os míseros inimigos.
Mas isso é a caravana do provérbio e os cães da assim chamada sabedoria popular, que tem muito pouco de popular e nada de sabedoria. Na prática, quem me diz que os cães não são moralmente superiores a caravana e latem de pura alegria ao encontrar companhia no deserto? Quem me diz que os cães não estão num belo oásis, bem alimentados e alegres, latindo apenas para dar as boas-vindas aos recém-chegados, contentes com novos irmãos-animais chegando ao sitio? Se for assim – e por que não ser assim? – os cães ficam decepcionados.
Pois a caravana passa. Mas não de soberba, de superioridade. Passa, corre! De medo! Bem que desejaria parar no oásis. Mas onde há cães, há homens. E esses homens é que a caravana teme. Pois, invertidos os papéis proverbiais, imediatamente descobrimos do que é composta essa caravana de camelos sarnentos, montados por malfeitores evadidos das gales de vários países, isso! Assassinos sem pátria, mercenários sem fé nem Deus, ladrões e estupradores, mercadores de escravos, traficantes de drogas do Oriente.
É por isso, por medo, e não por soberba, que a caravana passa. Passa sorrateira, escondendo-se atrás das dunas, até sumir nos desvãos da história.
Moral: Para uma caravana de degredados, todos os cães são cães policiais.
“Os cães ladram e a caravana passa”. A frase é sempre usada com sentido pejorativo em relação aos cães, como se ladrar fosse uma atividade inferior e/ou inamistosa em si mesma. Significa que os cães são invejosos, porque ladram para a caravana.
Na verdade, na frase, os cães nem são cães: estão ali no lugar dos raivosos e dos invejosos. Os cães representam coisas e sentimentos baixos, pessoas de índole mesquinha. Por isso, a caravana passa. Isto é, passa soberba. Passa não dando a menor pelota. Passa sem ligar para os latidos de inveja e ódio. Pois toda caravana é bacana, superior, acima dos vãos latidos da plebe.
Vejo a caravana do provérbio passar: é uma caravana rica, constituida de camelos fortes, racudos, bem-nutridos, magnificamente ajaezados. É uma caravana de corajosos comerciantes, daqueles que ampliaram fronteiras e enriqueceram o mundo. Representam a intrepidez, a Glória, a riqueza dos tempos. Por isso passam diante dos cães – famintos, claro! – que ladram esterilmente.
Se a caravana quisesse, pararia, bateria nos cães, ou os mataria, e só depois iria embora. Mas, pra que? Ela faz ouvidos moucos, ouvidos, propriamente, de mercador e se vai sem perder tempo com os míseros inimigos.
Mas isso é a caravana do provérbio e os cães da assim chamada sabedoria popular, que tem muito pouco de popular e nada de sabedoria. Na prática, quem me diz que os cães não são moralmente superiores a caravana e latem de pura alegria ao encontrar companhia no deserto? Quem me diz que os cães não estão num belo oásis, bem alimentados e alegres, latindo apenas para dar as boas-vindas aos recém-chegados, contentes com novos irmãos-animais chegando ao sitio? Se for assim – e por que não ser assim? – os cães ficam decepcionados.
Pois a caravana passa. Mas não de soberba, de superioridade. Passa, corre! De medo! Bem que desejaria parar no oásis. Mas onde há cães, há homens. E esses homens é que a caravana teme. Pois, invertidos os papéis proverbiais, imediatamente descobrimos do que é composta essa caravana de camelos sarnentos, montados por malfeitores evadidos das gales de vários países, isso! Assassinos sem pátria, mercenários sem fé nem Deus, ladrões e estupradores, mercadores de escravos, traficantes de drogas do Oriente.
É por isso, por medo, e não por soberba, que a caravana passa. Passa sorrateira, escondendo-se atrás das dunas, até sumir nos desvãos da história.
Moral: Para uma caravana de degredados, todos os cães são cães policiais.
Julio,
ResponderExcluirvocê não poderia ter encontrado texto melhor! E ainda mais escrito por quem?
Pois é, que a caravana e seus ASSASSINOS SEM PÁTRIA passem e sumam, escondidos, não atrás das dunas, mas, atrás das pilhas de dinheiro e do odor fétido que deixaram pelo caminho!
Abs. e bom fds!
maravilhoso!!! lindo!!!!!
ResponderExcluirLinddo maravilhososssssssssssssssso
ResponderExcluir