quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O LAPTOP DA XUXA.


Este texto foi "hit" na Internet no final do ano passado, mas como estamos já às vésperas natalinas e essa efeméride é a apoteose da inversão de valores e do consumismo desenfreado, e como recebemos este texto novamente do nosso amigo Esquerdinha, creio ser válido sua publicação para reflexão. O assunto é muito mais grave do que aparentemente é, e inocentemente se faz desapercebido. Isso sim, cara Jéssica, é prejudicial para as crianças, e não a exposição do belo e a sátira do cotidiano.

O jornal Folha de São Paulo publicou o depoimento de um jovem pai, que, aflito, dizia:
A minha filha pediu um laptop da Xuxa. Ela só tem três anos e fala direitinho ‘Laptop’. Acho que ela nem sabe o que é, mas viu na TV e quer de qualquer jeito. O pai afirma que já percorreu duas lojas à procura do ‘laptop da Xuxa’, mas que estavam com o estoque esgotado. Prossegue, dizendo que irá se dirigir, apesar da forte chuva, ao shopping, pois a felicidade de sua filha depende do tal laptop. Nada mais irá satisfazê-la, e não se contentará com um laptop de brinquedo similar,– quer unicamente o ‘laptop da Xuxa’. Apenas três anos de idade, e a marca do desejo já foi inscrita em sua subjetividade.
Enquanto as crianças assistem a desenhos e programas infantis, a educação para o consumo vai se instalando de forma poderosa no seu subconsciente. Como muitos pais passam longas jornadas fora de casa, e desconhecem o que os filhos vêem na televisão, vamos fazer uma breve descrição do comercial do brinquedo em questão.
O comercial inicia-se com Xuxa e duas meninas sentadas ao redor de uma mesa com cadernos e lápis de colorir. Xuxa diz que vai mostrar para as duas meninas algo muito mais legal e divertido. Nesta hora, entram em cena os efeitos especiais, e uma esteira colorida leva as três até o Céu E no Céu está o tal laptop. A esteira converte-se num gigantesco tobogã,
pelo qual elas descem escorregando felizes (reflita sobre como uma criança pequena processará tais fantasiosos efeitos visuais). E no fim do comercial, Xuxa apresenta os vários modelos e cores para se colecionar.
Trinta segundos se mostram suficientes para convencer a criança pequenina de que a felicidade reside no adquirir o produto anunciado. A esteira que conduz ao Céu.O incontido sorriso de Xuxa e das duas crianças figurantes, que mal cabem em si.
Ter = Ser Feliz.
O desejo de posse e o consumismo impostos a mentes indefesas, ainda na mais tenra idade. A pedagogia do consumo, – o aproveitar da imaturidade natural de uma criança pequena para convertê-la num consumidor precoce.
Gerações e gerações de crianças desenvolveram a criatividade e o gosto pela arte por meio de cadernos e lápis de colorir. E um comercial de 30 segundos consegue fazer com que a criança enxergue tal atividade como coisa do passado, e passe a almejar o objeto anunciado. “Lápis e cadernos de colorir, que coisa mais sem graça…”
A publicidade infantil se torna ainda mais cruel, desumana e desalmada quando recordamos que as crianças das famílias mais carentes encontram-se igualmente expostas à sua invasiva, massiva, desregulamentada e abusiva veiculação.
Nos países desenvolvidos, onde a Infância e a Educação são priorizadas, cuidadas e protegidas, existem leis regulamentando e restringindo a publicidade infantil. Nos Estados Unidos e na Europa, apresentadores de atrações infantis são proibidos por lei de ter sua imagem associada a qualquer produto comercial. A criança pequenina não tem a menor capacidade intelectual de compreender que por trás do comercial existem empresários, publicitários, diretores televisivos e seus milionários lucros comerciais. Para a criança pequena, o que há é apenas a Xuxa, que ela considera uma amiga, dizendo para ela que a felicidade reside no possuir tal laptop.
Fôssemos nós também um país desenvolvido, priorizando a Infância e a Educação, a apresentadora, os diretores televisivos, os publicitários e todos os demais envolvidos na criação e veiculação de um comercial como o do ‘Laptop da Xuxa’ estariam respondendo criminalmente, sujeitos a duras penas. O que se pode esperar de uma sociedade na qual, interesses comerciais se sobrepõem aos cuidados básicos com a Infância?… Os olhos e os ouvidos das crianças pequenas são sensíveis demais para a futilidade das novelas, as coberturas sensacionalistas dos dramas e tragédias humanas dos telejornais,…
Pode ser que ainda não seja tarde e possamos reverter o triste cenário que prevalece. Qual ação é mais prioritária do que o resgate do cuidado devido que a Infância merece?
"A luz, por mais fraca que seja, vale mais que todas as trevas juntas.”

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